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Pilha de jornais
Ideias e Letras

Um encontro inesperado

Os raios de Sol banhavam um campo de cultivo há muito abandonado. As nuvens? Nem sinal delas e o vento parecia ter tirado uma folga para deixar o dia mais bonito. Ora, por mera coincidência do destino, encontram-se nesse campo outrora certamente cultivado com os mais suculentos vegetais, três animais com diversos regimes alimentares. O diálogo que se segue é entre um pombo, uma vaca e um porco. Uma coisa que não cabe na cabeça de ninguém.



Porco – Ufa! Não sinto as pernas de tanto correr, após fugir daquela pocilga.

Pombo – Eu cá estou perfeitamente bem. Estas asas já percorreram muitas cidades, campos, rios…

Vaca – Finalmente uma companhia! Estou neste campo há tanto tempo que já nem sei como estará o meu antigo dono. São horas de almoço… Ainda bem que o que mais há aqui é erva tenra. (começa a comer)

Pombo – E tu, porco, tens fome?

Porco – Já comia… Mas o que agora me apetecia, eram umas belas peças de fruta.

Pombo – Bom, podes tentar deitar abaixo alguns frutos daquela árvore, parecem-me maduros.

(Enquanto o porco tenta desesperadamente colher alguns frutos da árvore, o pombo repara que a vaca come como se não houvesse amanhã)

Pombo – Devias estar mesmo cheia de fome. Como é que tens tempo de mastigar toda essa erva?

Vaca - Sim, é verdade que estava desejosa de uma erva mesmo tenra e olha que, como esta, já não me lembro de ter comido. Mas eu não preciso de mastigar tanto, por agora.

Pombo – Como assim, por agora?

Vaca – Bem, na boca, eu corto e esmago as plantas com a ajuda dos dentes. Estas plantas são depois insalivadas e rapidamente engolidas, ficando depois acumuladas na minha pança.

Pombo – Acumuladas na pança?! Deveras curioso… Conta-me mais.

Vaca – Quando estou em descanso, os alimentos passam para o barrete, onde são amassados. Depois disso, faço-os regressar à boca, através do esófago, para uma segunda mastigação, a que nós chamamos de ruminação.

Pombo – Estou a ver…estou a ver…

Vaca – Mas eu ainda não acabei. Os alimentos já ruminados são engolidos novamente e passam para o folhoso, onde é absorvida a água. Do folhoso, os alimentos seguem para a coalheira, onde são quimicamente transformados através da ação de sucos digestivos. Por fim, os alimentos vão para o intestino, onde os nutrientes são absorvidos. As fezes são expulsas pelo ânus, mas isso sabes tu muito bem.

Pombo – Que bela aula de Ciências Naturais! Deixa-me adivinhar. A tua primeira mastigação tem de ser rápida pois, como a erva que comes tem poucos nutrientes, necessitas de a comer em grande quantidade e usas a pança como armazém. Isso é que é aproveitar bem o tempo.

Vaca – Exatamente. Só para concluir, as principais adaptações ao meu regime alimentar são diversos tipos de dentes na boca, com incisivos e molares grandes e um espaço sem dentes, uma barra ou diastema, como preferires. Tenho um esófago em forma de tubo, que facilita a passagem dos alimentos para o estômago e, depois, o seu regresso à boca para poder passar à ruminação.

Pombo – Ah! Já entendi. Então vocês, os ruminantes, têm um grande estômago composto por quatro compartimentos, a pança, o barrete, o folhoso e a coalheira.

Vaca – E temos ainda um intestino muito longo, com uma absorção digestiva muito lenta.

Porco (ao longe)Pombo! Sr. Pombo!

Pombo(O Pombo aproxima-se do Porco) Já ouvi. Aqui vou. Ora diz lá o que pretendes.

Porco – Porque é que não me dás aqui uma ajudinha?

Eu não consigo chegar lá acima. Já tentei abanar a árvore, já saltei… Já tentei de tudo! Eu pensei que tu, como tens umas belas asas, poderias voar e atirar cá para baixo aquelas maçãs que ali estão.

Pombo – Ok, eu ajudo-te.

(Em menos de nada, as maçãs estavam cá em baixo e o Porco a comer sofregamente.)

Pombo (admirado) – Olha outro… Então tu também precisas fazer armazenagem e uma segunda mastigação, para estares a comer tão rapidamente? Ou tens medo que as maçãs te fujam?

Porco – Não, não... Eu simplesmente estou mesmo cheio de fome.

Pombo – Bem, já que aprendi como funciona o sistema digestivo da Vaca, não me custa nada aprender também como funciona o teu. Vá, podes começar a aula, que eu gosto de aprender!

Porco – Então aí vai. Ao longo da minha digestão acontecem ações mecânicas e químicas. A digestão inicia-se na boca, onde, através da mastigação e da insalivação, os alimentos são triturados e esmagados, passando assim a serem chamados de bolo alimentar. É ainda na minha boca que começa a digestão dos glícidos. Depois, o bolo alimentar passa para o esófago através da faringe, onde ocorre a deglutição. No esófago, o bolo alimentar é empurrado para o estômago, através de movimentos peristálticos.

Pombo – Estou a ver que o teu sistema digestivo é mais complicado que o da Vaca.

Porco – Vais ver que não. O bolo alimentar entra no estômago pela cárdia e, uma vez lá dentro, sofre fortes movimentos peristálticos. Ainda no estômago, atua o suco gástrico. O bolo alimentar transforma-se em quimo e inicia-se a digestão dos prótidos. Os alimentos, agora sob a forma de quimo, são evacuados do estômago, através de pequenos jatos, pelo piloro.

Pombo – Isto é que é um grande sistema digestivo. Como é que tu sabes tudo isso?

Porco – É o meu metabolismo, tenho de aprender a viver com ele e, depois de algum tempo, isto já sai “de cor e salteado”. Depois da saída do estômago, o quimo segue para o intestino delgado, onde se dá a digestão das gorduras e conclui-se a digestão dos glícidos e dos prótidos. Ainda no intestino, acontecem mais movimentos peristálticos e é aí que atuam o suco pancreático, produzido no pâncreas, o suco intestinal, produzido no intestino delgado e a bílis, produzida no fígado. Este último atua maioritariamente sobre as gorduras. É então que o quimo se transforma em quilo.

Pombo – Hoje, aqui o Sr. Pombo chega a casa muito mais culto.

Porco – Continuando… o quilo divide-se em duas partes. Uma delas prossegue para o intestino grosso, onde ocorrem movimentos peristálticos, a absorção da água e a ação de algumas bactérias. Formam-se então as fezes, que passam para o reto e para o ânus, onde são excluídas. Mas a outra parte sofre a absorção digestiva. Nesse processo, os nutrientes existentes no quilo são absorvidos para o sangue e para a linfa, chegando depois às células. Para finalizar, nas células ocorre a última fase, a assimilação. A assimilação é a transformação, no interior da célula, dos nutrientes recebidos do exterior de modo a que estes sejam utilizados de acordo com as suas respetivas funções.

Pombo – Ok, já entendi. Há uns tempos atrás, ouvi tudo isso numa aula de Ciências Naturais. Tratava-se de uma escola e eu estava a descansar no parapeito de uma janela. Então, tu tens o mesmo sistema digestivo de um humano. Sistema omnívoro.

Porco (entre dentadas nas maçãs) – Perguntas-me se tenho o mesmo sistema digestivo daqueles animais de quatro patas, mas que, porém, usam duas delas no ar? Acho que se pode dizer que sim.

Pombo – Ver-vos a comer deu-me cá uma fome… Será que há por aqui algumas sementes ou algo do género porque, como decerto sabem, eu só como grãos e afins.

(A Vaca junta-se à conversa)

Vaca – Receio que por aqui não haja nada disso. Mas não te preocupes, porque eu conheço uma eira onde há sementes à tua mercê! Foram postas a secar recentemente.

Pombo – Perfeito! Vamos então, Vaca, guia-nos até essa eira.


Poderia dizer-vos que a viagem foi fácil, mas estaria a mentir. Foram muitos quilómetros andados e, como o Pombo tinha de esperar pelos seus dois companheiros, não podia começar a voar rapidamente. Mas valeu a pena esperar, porque quando finalmente chegaram, o pombo nem queria acreditar. À sua frente estava uma grandiosa eira, cheia de sementes de arroz, milho e trigo. E eram esses os alvos preferidos do Pombo.


Pombo – Ora, assim está bem… Vaca, muito obrigado por me mostrares este belo lugar.

Vaca – De nada. Agora, serve-te à vontade, que acho que os donos estão longe.

(Com a grande velocidade das suas asas, o Pombo ataca velozmente as apetitosas sementes.)

Porco – Então, mas diga lá, Sr. Pombo: como é que sem ter dentes consegue mastigar as sementes?

Pombo – Com que então chegou a minha vez de dar a aula… É para Já! Os grãos são engolidos inteiros, já que não tenho dentes e passam do meu esófago para o papo, onde são armazenados e amolecidos, com a ajuda de areias que costumo e devo consumir regularmente.

Vaca – Espera lá, mas o que é isso de papo?

Pombo – É uma dilatação do esófago, onde os grãos são armazenados e amolecidos, como já tinha referido anteriormente. Os alimentos vão para o estômago, que é formado por duas partes: o proventrículo, onde os grãos são misturados com suco digestivo, e a moela, onde os mesmos são triturados pelas contrações das suas paredes grossas e musculosas. Da moela, os nutrientes passam para o intestino, onde são absorvidos. As fezes são expulsas pela cloaca.

Porco – Ok, já entendi. E no que respeita a fezes, todos temos que as largar.

Pombo – As minhas adaptações ao meu regime alimentar são possuir um bico, em vez de dentes, ter um esófago com uma dilatação - o papo - e ter um estômago composto por dois compartimentos, a moela e o proventrículo.


Por aquela altura, parecia que o vento tinha voltado da folga e que o Sol estava prestes a adormecer. Estava um final de tarde lindíssimo, ainda que um pouco frio. Por fim, o Sol despediu-se dos três amigos e deu lugar à sua companheira, a Lua. E assim fizeram também os três animais. Despediram-se e puseram-se a caminhar para o horizonte, já que, afinal, nenhum dos três tinha uma casa definitiva. O que fizeram a seguir não é certo, mas sabe-se que os três saíram daquela aventura mais ricos. Ricos em conhecimentos.


Escola Grão Vasco

Tomás Dias n.º 18, 6.ºI


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